Quando estamos diante dos diversos meios de comunicação e nos deparamos frente a casos de criminalidades assombrosas, corrupções alarmantes, desastres naturais inimagináveis, ações espantosas de pessoas que nunca esperamos, somos logo tentados a associá-los a velha imagem do fim do mundo. Será mesmo que estamos nos aproximamos de um fim ou isso é um sinal que a vida não é tão perfeita como imaginamos?
Deus quando criou o mundo do caos, colocou uma ordem nessa realidade: o mundo deveria evoluir. Sua inteligência não apenas criou, mas dispôs tudo segundo um determinado projeto de perfeição. A própria imagem do Cristo como plenitude da criação nos dá essa compreensão. Tudo tende para Ele, é com Ele e por Ele.
Entretanto, essa evolução da natureza, tendo o homem como centro, ocorre de forma material, portanto, contingente. Ou seja, se estamos diante de realidades materiais e históricas, estaremos conseqüentemente perante seres e realidades falíveis, passíveis de corrupção, possíveis de destruição.
Nesse sentido, não podemos projetar a responsabilidade das desgraças de nossa vida para Deus. Destruir homens ou o próprio mundo, em último caso, seria entrar em contradição com a obra da criação que deveria levar tudo e todos para Cristo, isto é, para a plenitude.
Se eu dirijo em alta velocidade, de forma irresponsável, descumprindo normas ou apenas me descuido em algum momento e me acidento, seria mesmo responsabilidade de Deus tal resultado? Se eu moro em um ambiente passível de desastres naturais, posso colocar a culpa em um terceiro se sofro as conseqüências de um maremoto, terremoto ou coisa semelhante? Se ajo de forma leviana com os outros e sofro as implicações de minha postura, poderia afirmar que Deus me abandonou ou sofro por causa de sua ira?
A física nos ensina que toda ação gera uma reação. É aí que a inteligência de Deus se manifesta, como realidade que circunda a minha vida, não como um juiz que bate o martelo a cada ação isolada. É nesse sentido que a imagem de um fim para o mundo ou para os homens pode aparecer: “Eis que virá o dia, abrasador como fornalha, em que todos os soberbos e ímpios serão como palha; e esse dia vindouro haverá de queimá-los, diz o Senhor dos exércitos, tal que não lhes deixará raiz nem ramo” (Ml 3, 20a).
A “morte” do pecador ou o fenecimento, mais cedo ou mais, de uma ação equivocada reflete que nosso mundo tende para uma perfeição, para uma evolução que vai desembocar na plenitude da humanidade e não na sua destruição. E é o próprio Jesus que nos enche de esperança: “É preciso que essas coisas aconteçam primeiro...” (Lc 21, 9). É preciso que as desgraças, os equívocos, as criminalidades e as conseqüências de todas essas se manifestem para que possamos aprender a dinamicidade e a ordem, querida por Deus, disposta no mundo.
Ações naturais ou provocadas pelos homens geram mortes porque agimos de forma equivocada, a “condenação” foi apenas uma conseqüência lógica, a reação motivada por uma ação limitada. Quando agimos de forma equivocada estamos “gerando” o mal e o primeiro a sofrer com ele é que está mais próximo. Esse fim material do erro também é o sinal de que a providência divina está sempre a retomar a criação em suas mãos quando o homem a corrompe.
Quando o anjo do Senhor anunciou a Maria que ela seria responsável por gerar em sua vida a Palavra de Deus, ela não aceitou de forma utópica ou ideal tal proposta. A jovem de Nazaré sabia as possíveis conseqüências de sua opção, aquele não seria um caminho fácil, era preciso entregar-se, abaixar-se, humilhar-se até aquele “eis-me”. Foi por meio daquele sim sacrifical que a Vida plena entrou no mundo, uma ação de entrega que teve uma reação salvadora, não só individual, mas universal.
Que nós também possamos, paulatinamente, compreender a dinâmica do Reino de Deus que se manifesta a cada momento de nossa história. Ele não é uma realidade projetada por uma vontade frustrada, mas é material, é força que nos abraça e nos acompanha no caminho que nos pede um sim à humanidade que nos circunda, um sim à perfeição que nos atrai para Si.
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