quinta-feira, 8 de abril de 2010

Lugar de criança é na família


Passados os movimentos realizados pela mídia e baixada a poeira dos sensacionalismos, somos chamados a analisar o caso do assassinato de Isabella Nardoni pelo seu próprio pai e por sua companheira. Mais do que um homicídio com um alto grau de perversidade, esse acontecimento reflete o rosto da estrutura da maior parte de nossas famílias.

Quando vemos um crime como esse, onde os pais – no caso o pai – é responsável pela morte de uma criança indefesa, somos logo tentados a emitir um julgamento direto sobre os culpados. Longe de querer inocentar os responsáveis pelo ato, devemos, antes de tudo, considerar os fatos e saber inseri-los em determinados contextos mais amplos.

Não estamos somente diante de um caso isolado de infanticídio, mas perante uma conjuntura muito maior que cerca nossas famílias e é responsável pela sociedade que temos. A falta de maturidade, orientação ou perspectivas na hora de formar uma família leva à formação de uniões instáveis, sem bases sólidas que sejam fontes de segurança e boa formação para os indivíduos que delas surgem.

Divórcio, separações e conflitos familiares são resultados da falta de um elemento essencial para a constituição de um verdadeiro lar: o diálogo. Esse instrumento tão simples parece estar sendo esquecido dentro de uma estrutura social que vêm privilegiando as relações descartáveis. Nesse sentido, o casamento passa a ser uma união social com prazo de validade: até o primeiro conflito.

Que o olhar do Cristo ressuscitado faça nascer em nós também essa postura de seres que sabem olhar para os acontecimentos do mundo de forma menos censora e mais misericordiosa, que os erros dos homens – mesmo os mais aberrantes – não são resultados somente de uma ação “demoníaca”, mas que surgem a partir de realidades que favorecem determinados fatos.

Que nós saibamos aprender até mesmo com Tomé, que soube testar a ressurreição do Jesus ao tocar nas suas feridas (cf. Jo 20, 25). A paz que tanto queremos para os nossos lares não cairá dos céus, mas será construída quando tivermos a coragem de encarar as nossas chagas, tocar e aprender com elas.

Conflitos e dificuldades familiares nunca foram nem nunca serão motivos para separações, mas um caminho para que o sentido da vida brote. Aproximar-se de cada problema e vê-lo com um olhar mais amplo e menos crítico é a via mais próxima para vislumbrar a ressurreição do homem que se dá quando seus problemas são superados.

Diante desse caso, saibamos confirmar o valor da família, onde marido e mulher são os primeiros responsáveis pela educação dos filhos e que as crises que daí surgirem não são motivos para separações ou brigas maiores, mas possibilidade de crescimento pessoal e comunitário. A morte de Isabella é para nós uma lição: que verdadeiro lugar do crescimento e educação de uma criança é nos braços de papai e mamãe, unidos.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Via Crucis: caminho da vida

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Como olhamos para a Cruz? Como estamos nos relacionando com a nossa vida? Estamos realmente tratando a nossa existência realmente como humana ou continuamos a buscar fugas espirituais, filosóficas ou materiais para dar um sentido para tudo isso?

Quando passeamos pelos canais e televisão ou pelas propagandas da vida, percebemos que a maior parte dos produtos oferecidos facilita a nossa vida, em todos os aspectos. Isso é positivo até o momento em que o homem passa a se perder nessa cultura e deixa de viver sua humanidade para buscar o mundo do mais fácil.

O filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), considerado por muitos como não-cristão, nos propõe um questionamento singular. No livro A gaia ciência, em seu aforisma 341, Nietzsche questiona ao seu interlocutor como ele reagiria se um anjo chegasse até ele e afirmasse que sua vida retornaria em todos os aspectos, se repetiria até o infinito. Qual seria a nossa postura diante desse anjo: agradeceríamos ou negaríamos tal fato?

Dentro desse questionamento há outro implícito: como lidamos com a nossa vida? As tristezas passadas nos ensinaram algo ou apenas se acumularam em nossa história criando incrustações em nosso coração, feridas que não se apagam? Agradecer a mensagem daquele anjo significaria que sabemos olhar para todos os acontecimentos da vida como necessários para o crescimento humano, não como peso.

Cristo, ao aceitar tamanho sacrifício, mostra o caminho para a vida, para o verdadeiro sentido da existência que está na aceitação de seu caráter diverso, de vitórias e fracassos. Nesse sentido, três imagens nos são capitais para compreender a mensagem cristã de aceitação da nossa humanidade: a figura do Cristo sofredor, a postura diante da crucificação e o túmulo vazio, que significa a libertação do homem da morte e de todo sofrimento que possa o escravizar.
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“Eis o homem” (Jo 19, 5)

As palavras de Pilatos, mesmo inconscientes, confirmam a verdadeira natureza do homem: ele é perecível. Por mais que vivamos sob o domínio de poderes simbólicos e ídolos sociais, políticos e culturais, a verdadeira imagem do homem sempre se mostra, basta olhar para a nossa história.

Porém, essa revelação demonstra que a dignidade do homem está em ser plenamente criatura, completamente humano, inteiramente obra de Deus. Aceitar tal condição é o caminho mais próximo para abraçar a nossa humanidade e confirmar a Vontade de Divina.

Todo o sofrimento de Cristo ensina uma postura a qual sempre estamos a fugir: o sacrifício. Queremos sempre tudo o que é mais fácil, o que dá menos trabalho e o que gasta menos tempo. Esquecemos que, por meio de nossos esforços, podemos nos tornar protagonistas na construção de uma sociedade com o nosso rosto, mais cristã e menos desumana.

Ao deixar que todas aquelas ações se cumprissem, Jesus estava nos dando uma lição vital, que todos os acontecimentos de nossa vida têm algo a os ensinar: os de bem confirmam o nosso testemunho, os de mal, modelam-nos sempre mais para a perfeição da existência humana.
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“Tudo está realizado” (Jo 13, 30)

Mais do que um fim, o momento da cruz mostrava a plenitude do caminho para a redenção. Só há uma plena realização da existência humana quando abrimos nossos braços para a cruz. O Filho de Deus, ao entregar seu espírito ao Pai realiza a plenitude da salvação humana. Ela não está mais fora, mas no próprio homem.

Ao estender os seus braços na cruz, Jesus se abria completamente à vontade da Divina Providência, que o queria como testemunho da Verdade. Essa estava encerrada no homem em sua plenitude.

A disponibilidade para a cruz pelo silêncio, entrega e morte foi o caminho encontrado por Ele para nos dizer que em nossa vida não só existe alegrias, prazeres e bem-estar. Ela é matéria e história, e, como tal, possui limitações, fracassos, adversidade e dores. Saber olhar para nossa existência como esse complexo de altos e baixos, é saber ser mais real com nossa humanidade, é ser mais humanos.
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“Ele não está aqui!” (Lc 24, 6)

Cristo não está morto! Ele vive! Permanece na nossa história para nos mostrar que a vida do homem tem um sentido, e que esse não está muito distante do que pensamos.

A ressurreição afirma a vitória da vida sobre toda a adversidade, até mesmo sobre a sua total contradição. Nesse sentido, a alegria do renascimento do Filho do Homem sobre a morte não é somente histórica, mas eterna, porque confirma que a Lei e os Profetas não esperaram em vão e que o testemunho de Cristo foi verdadeiro.

A humilhação, o flagelo, a coroa de espinhos, a zombaria, os pregos nas mãos e nos pés ganham um novo sentido no domingo. A vida, porque vida, recomeça depois de cada queda, a luz só passa a ser percebida e glorificada por que houve uma escuridão, um momento para que os olhos se fortalecessem na baixa visão.

Como aquelas mulheres, que nós saibamos confirmar a fé na Palavra de Nosso Senhor entrando nos túmulos de nossa existência. Ao entrar, perceberemos que Ele não está lá, que não se prende ao sofrimento nem à morte, mas cresce com eles, porque soube passar vitorioso para a plenitude da existência humana que é a comunhão com a Suprema Perfeição. Nesse caminho vamos ouvir novamente a voz do anjo:
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“RESSUSCITOU!!!”
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