sábado, 30 de maio de 2009

Diversidade para a Perfeição

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O homem, mais do que um animal dotado de razão, possui a característica de ser diverso de todos os outros. Cada pessoa possui características tão distintas e múltiplas que se tornam únicos na comunidade. A partir dessa variação de potencialidades humanas a sociedade pode enriquecer-se de valores diversos, sempre em busca do bem comum.

O apóstolo Paulo compreendeu bem essa diversidade quando propôs a imagem da sociedade orgânica. Em suas palavras: “De fato, o corpo é um só, mas tem muitos membros; e, no entanto, apesar de serem muitos, todos os membros do corpo formam um só corpo”. (1 Cor 12, 12). Cada um, dentro de sua individualidade, agiria em busca de uma comunhão, semelhante ao corpo, onde cada órgão possui sua função e importância imprescindível para o conjunto. Assim como no organismo humano não pode haver somente olhos ou bocas, corações ou veias, a sociedade é valorizada somente com a diversidade humana.

Esses dons diversos que são dados pelo Espírito de Perfeição de Deus, possuem um valor objetivo. Quando o Paráclito desceu sobre os apóstolos, eles foram enriquecidos com diversas habilidades e “começaram a falar em várias línguas” (Jo 22 4), tendo em vista o anúncio de Jesus, morto e ressuscitado, aos diversos povos do mundo. As capacidades que nos são dadas não são nossas, mas são designadas para o bem comunitário, elevando-nos à Deus, através da pessoa de Cristo, único modelo de vida.

Desconsideramos, muitas vezes, essa gratuidade para a comunhão, quando exigimos de Deus certos talentos e graças que buscam somente o nosso bem-estar. Nessa busca por uma felicidade permanente é esquecida a dimensão do próprio sofrimento humano, condição necessária para se chegar à paz prometida pelo Deus-Homem, paz que só é conquistada com um espírito de sacrifícios e lutas.

Esquecemos, por outro lado, também que o Espírito de Deus age de forma pessoal. Não podemos, com isso, exigir que todos tenham as nossas capacidades e dons. Sentindo-nos perfeitos, nos consideramos paradigma, isto é, um modelo a ser seguido, afirmando que todos devem ser iguais a mim: pensar como eu penso e fazer como eu faço.

Somos chamados a perceber a ação de Deus em nossa humanidade. Se Ele atua de forma diversa e pessoal, Sua manifestação em nós, que são Seus dons, também será distinta. Nessa multiplicidade de carismas podemos nos aproximar de uma perfeição que só é realizada de forma comunitária e múltipla.

Que também nós possamos construir essa imagem do corpo em nossas comunidades, percebendo como o outro pode contribuir para o bem comum e também como eu posso cooperar para a edificação desse organismo social. Que possamos agir, mesmo de forma individual, diversa e incompleta, no aperfeiçoamento desse corpo físico, de modo a construir um Corpo Espiritual Perfeito, tornando vivo e manifesto o Espírito Santo e Santificador de Deus.
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[Artigo Publicado no Jornal "A Folha", da Diocese de Caicó, ANO XXI, Nº 158, 30/05/2009]

Anunciar: seguir imitando o Cristo

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Estamos, a cada dia, sendo marcados por um progresso científico, tecnológico e político-social. Esse desenvolvimento, porém, parece esquecer que seu fim está na melhoria da vida humana. É dado, muitas vezes, mais excelência aos meios, aperfeiçoando-os progressivamente e esquecido o bem do homem como fim de toda ação social e científica.


O sociólogo alemão Max Weber afirmou que: “As sociedades modernas caminham no sentido de uma crescente racionalização e burocratização”. Isto é, complicamos o nosso modo de ser e agir e esquecemos nosso fim último que é a busca do bem próprio e comum.


Antes de subir aos céus, Jesus nos deixa uma ordem: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa-Nova a toda criatura!” (Mc 16, 15). Porém, após a sua ascensão, os discípulos que permanecem a olhar para o céu parecem esquecer do imperativo de Cristo de também não se apegar aos “tempos ou momentos” determinados pela Providência Divina. Queremos, quase sempre, delimitar e denominar realidades que sempre estão além de nossas capacidades.


Em nossas ações pastorais também nos apegamos a muitas coisas e esquecemos-nos do essencial que, nas palavras de Saint-Exupéry, “é invisível aos olhos”. Planejamos e desenvolvemos muitas atividades e esquecemos-nos do principal que é seguir e imitar Cristo.


Apegamos-nos a regras e esquecemos que elas são feitas para nos dar um caminho em direção à uma santidade, à Perfeição. Atrelamo-nos e discutimos excessivamente as doutrinas e perdemos o sinal de que elas nos direcionam para uma verdade muito maior. Quando assumo certas práticas e esqueço que elas devem somente manifestar um sentimento interior, estou desvirtuando-as, tornando-me como os fariseus.


Agimos e pensamos muitas coisas e esquecemos de que elas são somente meios relativos que nos levarão ao imperativo categórico, isto é, a ordem universal e necessária dada por Cristo do amor por Deus que se manifesta e é concretizado no amor-caridade ao próximo.


Buscamos muitas vezes conceituar idéias, delimitar ações e emitir julgamentos, esquecendo de uma humildade necessária para aquele que deseja seguir Jesus e, achando-se conhecedores do bem e do mal, deixamos de lado o próprio Deus, supremo e único Juiz que é justo, mas também misericordioso e amoroso.


Parece que esquecemos que somente Deus, como Suprema Perfeição, relativiza todas as coisas, Ele que “pôs tudo debaixo de seus pés e O constituiu [Cristo] acima de tudo” (Ef 1, 22). Somente Deus, em Jesus, é absoluto e primeiro, o resto é relativo e secundário. Segui-lo, portanto, é o que há de mais necessário e essencial em nossas vidas. Também, tudo que nos leva à Deus, em Jesus, também é essencial e necessário.


A promessa de que receberíamos o Espírito Santo e seríamos testemunhas do Cristo esclarece bem de que modo será a missão proposta pelo Senhor. Ser testemunhas da humildade, anúncio, sofrimento, morte e ressurreição de Jesus é segui-lo e imitá-lo, fazendo com que Ele esteja presente todos os dias em nossas vidas, “até a consumação dos séculos” (Mt 28, 20).

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[Artigo Publicado no Jornal "A Folha", da Diocese de Caicó, ANO XXI, Nº 157, 23/05/2009]

Amor é dom, não mercadoria

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O homem, mais do que um animal dotado de razão, possui a característica de ser diverso de todos os outros. Cada pessoa possui características tão distintas e múltiplas que se tornam únicos na comunidade. A partir dessa variação de potencialidades humanas a sociedade pode enriquecer-se de valores diversos, sempre em busca do bem comum.


O apóstolo Paulo compreendeu bem essa diversidade quando propôs a imagem da sociedade orgânica. Em suas palavras: “De fato, o corpo é um só, mas tem muitos membros; e, no entanto, apesar de serem muitos, todos os membros do corpo formam um só corpo”. (1 Cor 12, 12). Cada um, dentro de sua individualidade, agiria em busca de uma comunhão, semelhante ao corpo, onde cada órgão possui sua função e importância imprescindível para o conjunto. Assim como no organismo humano não pode haver somente olhos ou bocas, corações ou veias, a sociedade é valorizada somente com a diversidade humana.


Esses dons diversos que são dados pelo Espírito de Perfeição de Deus, possuem um valor objetivo. Quando o Paráclito desceu sobre os apóstolos, eles foram enriquecidos com diversas habilidades e “começaram a falar em várias línguas” (Jo 22 4), tendo em vista o anúncio de Jesus, morto e ressuscitado, aos diversos povos do mundo. As capacidades que nos são dadas não são nossas, mas são designadas para o bem comunitário, elevando-nos à Deus, através da pessoa de Cristo, único modelo de vida.


Desconsideramos, muitas vezes, essa gratuidade para a comunhão, quando exigimos de Deus certos talentos e graças que buscam somente o nosso bem-estar. Nessa busca por uma felicidade permanente é esquecida a dimensão do próprio sofrimento humano, condição necessária para se chegar à paz prometida pelo Deus-Homem, paz que só é conquistada com um espírito de sacrifícios e lutas.


Esquecemos, por outro lado, também que o Espírito de Deus age de forma pessoal. Não podemos, com isso, exigir que todos tenham as nossas capacidades e dons. Sentindo-nos perfeitos, nos consideramos paradigma, isto é, um modelo a ser seguido, afirmando que todos devem ser iguais a mim: pensar como eu penso e fazer como eu faço.


Somos chamados a perceber a ação de Deus em nossa humanidade. Se Ele atua de forma diversa e pessoal, Sua manifestação em nós, que são Seus dons, também será distinta. Nessa multiplicidade de carismas podemos nos aproximar de uma perfeição que só é realizada de forma comunitária e múltipla.


Que também nós possamos construir essa imagem do corpo em nossas comunidades, percebendo como o outro pode contribuir para o bem comum e também como eu posso cooperar para a edificação desse organismo social. Que possamos agir, mesmo de forma individual, diversa e incompleta, no aperfeiçoamento desse corpo físico, de modo a construir um Corpo Espiritual Perfeito, tornando vivo e manifesto o Espírito Santo e Santificador de Deus.

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[Artigo Publicado no Jornal "A Folha", da Diocese de Caicó, ANO XXI, Nº 156, 16/05/2009]

sábado, 9 de maio de 2009

Mea Culpa

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Diante de situações de crise, o homem é sempre levado à dar uma resposta a esses conflitos na busca de respostas que possam solucioná-los. O problema é iniciado quando o próprio homem ausenta-se ou se distancia de seu contexto social para a emissão de julgamentos. Projetar a responsabilidade de uma situação-problema para outros é sempre uma marca humana que precisa ser repensada.


A crise financeira mundial, mais do que um problema econômico, mostra somente a ponta de um iceberg, de uma decadência que afeta também a dimensão política, educacional, sanitária, ambiental e moral. Esse declínio social conjunto é constituído porque a própria comunidade global está interligada.


Entretanto, somos levados à afirmar que toda a causa dessa crise global é fruto de relações de injustiça entre os governantes e o capitalismo. É esquecido o fato de que a sociedade democrática possibilita uma representação, ainda que falha, de nossos interesses na organização social. Portanto, essa política vigente também é fruto da qualidade de nosso voto e de nossa participação político-social.


Inseridos em uma comunidade “conectada”, somos chamados à um sentimento de corresponsabilidade pelo outro. Dentro do imperativo não só cristão, mas, acima de tudo, humano, de corrigir os que erram, não agir contra uma realidade é ser conivente com ela.

A própria omissão, nesta ação de responsabilidade pelo outro e pela sociedade, já seria uma atitude. Quando não agimos contra uma determinada realidade é porque nos conformamos com ela. A negligência diante de um acontecimento demonstra a descrença na esperança de avanço social, contrário à esperança cristã de renascer da morte para a vida após o sofrimento da cruz.

A imagem evangélica da videira (Cf. Jo 15, 1-7) apresenta a necessária relação entre todos os indivíduos tendo Jesus Cristo como centro e eixo norteador dessa comunhão. Semelhante à Igreja nascente (Cf. At 9, 31), somos chamados a nos mantermos em união com nossa comunidade, próximos à Deus, através da pessoa de Cristo e integrados pela providência do Espírito Santo, seiva que perpassa toda a videira.


É Ele quem nos mantém unidos no sentimento de compaixão e corresponsabilidade pelo outro, no comprometimento político e social. Nessa “Eucaristia comunitária”, o duplo mandamento do Senhor, do amor à Deus e ao próximo(Cf. 1 Jo 3, 23), é unificado. Se estamos unidos ao Cristo, tronco da videira, e aos irmãos, nossa ligação com Ele dará frutos por meio de uma ação caritativa, tornando concreta a nossa fé.


Com um sentimento de humildade, devemos nos transformar em cidadãos inseridos e integrados em uma realidade sociopolítica e, principalmente, responsáveis por ela. Aprendamos a fazer o mea culpa no sentimento de compaixão e responsabilidade pelos atos e omissões nossos e dos outros.


Que, na comunhão com Jesus, saibamos nos aproximar de nossos irmãos, sentindo-se até mesmo culpados pelos seus delitos e pelos conflitos que ocorrem ao nosso redor. Deixando-se sempre modelar pelo Supremo Agricultor, façamo-nos partes integrantes e essenciais dessa grande videira que é a comunidade.


[Artigo Publicado no Jornal "A Folha", da Diocese de Caicó, ANO XXI, Nº 155, 09/05/2009]