domingo, 23 de agosto de 2009

Esvaziar-se para Deus

Celebrar a assunção da Mãe de Jesus, mais do que relembrar um fenômeno histórico-religioso, é um ato de olhar para aquela que soube se por diante do projeto maior que Deus tem para a nossa humanidade.


A partir do período histórico do modernismo, o homem passa a ter a capacidade de conhecer toda a realidade que o envolve. Esse conhecimento faz crescer a pretensão de que se pode “abraçar” todas as coisas. Todas elas, “visíveis e invisíveis”, passam pelo crivo da razão e, com isso, o homem passa a querer explicar tudo o que o envolve.


Longe de querer negar o valor da ciência ou da razão, fato é que o homem aproxima-se de si mesmo, aumentando exageradamente o seu valor, e nega um Absoluto, algo que deva estar superior a ele. Com isso, ele perde a possibilidade de fundamentar as suas certezas ou de alicerçar seus valores em um princípio unificador que possa direcionar as ações das pessoas e um só sentido.


O filósofo alemão Friedrich Nietzsche, afirma que o homem, diante das inúmeras possibilidades de conhecimento, está diante de um “mar aberto”. Sem terra firme, a pessoa humana sai em direção ao caos de sua realidade sem rumos ou princípios que dão norte ou firmam a sua vida.


Devemos ver na figura de Maria, aquela que se deixou ser guiada pelos planos divinos. Foi somente a partir do seu total esvaziamento, que a Palavra de Deus pode entrar completamente em seu ser, sendo gerada em seu espírito e em seu corpo. Toda a felicidade de Maria estava, portanto, em sua entrega ao Senhor, como ela mesmo exulta: “meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, porque olhou para a humildade de sua serva” (Lc 1, 47-48).


É nesse sentido que a assunção da Mãe do Cristo se inicia na própria encarnação do Verbo. Sua entrega aos planos da Providência Divina, no reconhecimento da grandeza de Deus diante de sua pequenez, foi tão plena que a Palavra se aproxima dela e, por ela, se faz Homem.


Nós, entretanto, não devemos somente contemplar admirados esses imensos mistérios. Todo aquele que se deixar guiar por Deus, pela imagem do Cristo, modelo vivo do Seu ensinamento, tornará presente e atual esse grandioso fato. Essa pessoa fará com que Deus atue em nossa história, e ela mesma se aproximará, paulatinamente, da Plenitude da Vida. É somente quando todos se submetem a realidade Absoluta, que é possível uma dupla aproximação: de Deus no homem e do homem em Deus.


Toda a humanidade é chamada a elevar-se, como Maria, a mulher que tornou Deus possível em nossa realidade através de sua perfeita humilhação, deixando-se guiar por Cristo, palavra de Deus, que nos faz entrar em comunhão Consigo, aproximando-se da plenitude na Vida. Com isso, sabendo que todos os conhecimentos e capacidades humanas são meios para se construir e edificar, ainda que de forma imperfeita, o corpo vivo de Cristo, todos eles devem estar sujeitos aos planos maiores da Suprema Providência, que quer todos próximos de Si, sendo “tudo em todos” (1 Cor 15, 28).

[Artigo Publicado no Jornal "A Folha", da Diocese de Caicó, ANO XXI, Nº 168, 15/08/2009]

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