quinta-feira, 23 de abril de 2009

“Não me segure... Mas vai...”


A atitude de Cristo com Maria Madalena quando pediu que ela não o tocasse (Cf. Jo 20, 16s) é somente esclarecida com a repreensão feita a Tomé: “Felizes os que acreditaram sem ter visto” (Jo 20, 29). A contemplação do Cristo glorioso nos impele a uma ação de discipulado, de seguir os passos do mestre. Porém, quando queremos “abraçar” Deus com nossa limitada razão ou “tocá-lo” com nossos sentidos, recebemos a mesma censura: “Não me segure... Mas vai...” (Jo 20, 17).


Toda a ação humana que pretende “segurar” Deus dentro de conceitos é sempre falha. Ele, como Espírito Perfeito, é imaterial, isto é, não possui um corpo, e nunca pode ser compreendido ou tocado de forma completa. É por isso que a Suprema Perfeição não pode caber em imagens ou formas. Sempre que falamos de Deus com um conceito acabado ou em uma “fôrma”, estamos limitando aquele que é o Supremo Ser. Somos, portanto, chamados à contemplar Deus se deixando ser abraçados por Ele e não O retendo em nossos falhos sentidos ou em uma limitada racionalidade.


Todavia, além da contemplação do Deus glorioso ilimitado, a ressurreição requer uma atitude concreta: “Ide anunciar aos meus irmãos que se dirijam para a Galiléia. Lá eles me verão” (Mt. 28, 10). O voltar os olhos para a Galiléia é retomar as ações de Cristo. Por isso, o anúncio da boa notícia não é a proclamação do fenômeno da ressurreição após o fato da paixão e morte de Jesus, mas uma atualização de Seus gestos, Ele que está constantemente a nos pedir: “Segue-me”.


Nosso Senhor, quando retoma sua própria ordem e parte o pão, abre os olhos dos discípulos de Emaús (Cf. Lc. 24, 30s). A promessa “eles me verão” é cumprida quando cotidianamente retomamos a sua memória, seguindo-o.


Por outro lado, o gesto de tocar a chaga realizado por Tomé foi permitido por Jesus porque também somos chamados a participar do mistério da paixão, morte e ressurreição. Somos convocados à aproximar nossos sofrimentos e as feridas de nossos irmãos ao sofrimento de Nosso Senhor para que possamos participar de Sua páscoa, de uma nova vida.


É também feito a nós o convite de aproximação, mesmo que de forma imperfeita, do mistério do Cristo ressuscitado e também aprender com aqueles que testemunharam ou ainda testemunham, a cada dia, a ressurreição do Senhor em suas vidas. Para que o nascimento de uma nova vida ocorra é preciso voltar os olhos para a Galiléia e seguir os passos de Cristo, imitando-o.



O anúncio da ressurreição do Servo Sofredor, isto é, do evangelho (do grego ευαγγέλιον, euangelion: boa notícia), não está, por isso, limitado à palavras. A missão é a própria atualização das ações de Jesus em nosso dia-a-dia. Na união de nossos sofrimentos ao do Senhor e da morte de uma vida de pecado para um renascimento. Essa vida nova, em Cristo que é luz, se irradia por si mesma, sem a pretensão limitadora dos sentidos e da razão, isto é, das palavras. Anunciemos, portanto, o Cristo com nossas vidas, sendo verdadeiras testemunhas de sua paixão, morte e ressurreição.
[Artigo Publicado no Jornal "A Folha", da Diocese de Caicó, ANO XXI, Nº 152, 18/04/2009]

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