segunda-feira, 29 de março de 2010

“Não peques mais”

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Muitas vezes, o homem olha para si mesmo e para os outros como animais de carga. Somos caracterizados pelas somas de nossas ações. Tudo que fazemos vai se acumulando em uma espécie de caderneta de poupança, onde além dos atos, somam-se também “juros” que somente distorcem a verdadeira personalidade do indivíduo.
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Ao olharmos para um ex-detento, alguma pessoa que deixou a prostituição, o crime ou mesmo alguém que volta a estudar ou trabalhar depois de um longo período de ociosidade, por exemplo, projetamos logo uma crítica pessimista sobre eles. Não acreditamos que tais pessoas possam voltar a ser indivíduos com dignidade.
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Por outro lado, o homem tem uma possibilidade que lhe é singular: a resiliência. O termo, que provém da física, caracteriza a capacidade do objeto de voltar a seu estágio normal depois de uma adversidade. Algumas molas, por exemplo, tem a característica de retornar à sua estrutura anterior depois de ser esticada. Assim é a pessoa humana, ela é capaz de voltar ao que sempre foi, a possuir uma dignidade a ela inerente, mesmo após um momento de dificuldade, de desvios de sua essência ou estrutura.
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Quando vemos os erros do passado e os condenamos, estamos fadados a permanecer eternamente olhando para trás, esquecendo assim de viver o presente e dar a nossa vida esperanças de um futuro melhor. Os equívocos atravessados devem assumir somente o caráter pedagógico de nos fazer conscientes de não mais repeti-los. Meus erros me ensinam a partir do momento que sei olhar para eles como aprendizados, não como cargas que serão acumuladas por toda a minha vida.
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A atitude de Jesus de continuar escrevendo no chão depois que lhe apresentaram o caso de uma mulher adultera (cf. Jo 8, 7-8), mostra-nos que a concepção Divina de justiça difere totalmente da nossa, Deus quer um coração arrependido e decidido a voltar para Ele. A condenação daquela mulher ao apedrejamento eliminaria toda esperança de conversão de vida. Se Deus sempre agisse em um plano lógico de justiça, ninguém subsistiria (cf. Sl 129, 3) porque estamos sujeitos aos mesmos erros.
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É nesse sentido que o profeta Isaías nos adverte: “Não fiquem lembrando o passado, não pensem nas coisas antigas” (Is 43, 18) e São Paulo dá o seu testemunho de vida: “[...] não acho que eu já tenha alcançado o prêmio, mas uma coisa eu faço: esqueço-me do que fica para trás e avanço para o que está na frente” (Fl 3, 13). O que Deus quer do homem é um espírito decidido a voltar para Ele, mesmo depois de um período de afastamento.
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Ao omitir-se a fazer um julgamento, Jesus propõe que o olhar do que está em pecado deve ser para frente, adiante. O apego ao julgamento de uma atitude passada impossibilita o homem de perceber que ele é muito mais do que suas ações. Quando Jesus diz: “Pode ir, e não peques mais” (Jo 8, 11), ele mostra a sua esperança no homem que, mesmo com limitações e deficiências, sempre se apresenta como imagem e semelhança do Divino, como possibilidade de conversão por meio de um crescimento humano e comunitário.

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