quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A porta é estreita


O Tribunal Superior Eleitoral – TSE vem, recentemente, apoiando um comercial contra a compra de votos nas eleições desse ano. Em um deles, uma mulher troca um hospital bem equipado por uma dentadura. Em outro, um homem troca uma escola para os seus filhos por uma pilha de tijolos. Fingindo fazer uma grande transação comercial, outro homem vende-se a si mesmo por quatro anos, sendo preso em uma caixa junto a outras pessoas que também se venderam.

Quantas outras realidades poderiam ser a essas acrescentadas? Por quanto ou pelo quê nós vendemos a nossa consciência? Ela tem efetivamente um preço? Por que ela é, algumas vezes, vendida por preços tão baixos?

O fato é que estamos inseridos em uma comunidade imediatista. Queremos as coisas mais fáceis, que exigem menos esforço, que não necessitam de construção ou modificação. De forma equivocada, assumimos o ditado popular de que é melhor um pássaro na mão do que dois voando. Aceitamos realidades já prontas, por que simples, e evitamos construir as mais necessárias, as que são essenciais para a nossa existência individual e comunitária.

Conceitos como esforço, sacrifício, trabalho contínuo e perseverante estão a cada dia desaparecendo em uma realidade social que preza pelo fácil, prazeroso e já feito. É esquecido, porém, que essas opções que não estão bem fundamentadas desaparecerão como surgem: de forma rápida. Se quisermos realmente uma felicidade bem alicerçada, que não se desintegre na primeira adversidade, temos que construí-la no sacrifício. Ela querer algo que, muitas vezes, temos dificuldade em oferecer: tempo e esforço.

A figura da porta estreita oferecida por Jesus Cristo (cf. Lc 13, 24), ao ser questionado quanto aos que seriam salvos, apresenta bem a sua proposta de redenção. O homem só pode entrar no Reino de Deus, ou seja, ter uma vida plena e feliz se ele a construir gradativa e paulatinamente. Aceitar realidades fáceis, que não exijam muito trabalho, é querer entrar pela porta larga, uma entrada, porém, que nos leva a caminhos incertos.

A própria carta aos hebreus compreendeu a mensagem do Senhor quando afirma: “No momento mesmo, nenhuma correção parece alegrar, mas causa dor. Depois, porém, produz um fruto de paz e de justiça para aqueles que nela foram exercitados” (Hb 12, 11). Enfrentar a vida como trabalho que tem seus momentos de alegria e tristeza, dor e prazer, altos e baixos, é exercitar-se para tornar-se plenamente homem assemelhando-se àquele que foi plenamente Deus.

Nesse caminho, ver a dor ou o sacrifício não como um mal, mas como algo participante da vida humana é saber sentir a presença de um Deus que é pai e que está constantemente a nos proteger e ensinar. A carta afirma ainda: “o Senhor corrige a quem ele ama e castiga a quem aceita como filho” (Hb 12, 6). Quando aprendemos a sentir o peso da mão de Deus a nos modelar, nossa existência ganha um novo sentido e qualquer sofrimento transforma-se em alegria.

Maria foi testemunha da felicidade de quem procura entrar pela porta estreita. Ela soube curvar-se para adentrar numa realidade que tinha Deus como soberano e soube aceitar a proposta de salvação do homem ao permanecer, em pé, diante da Cruz. A mãe de Deus entendeu todo o sentido do sofrimento de seu filho quando silenciou diante desse mistério e contemplou a grandeza de sua ressurreição.

Que nós também, ao nos deparar diante de realidades fáceis, possamos nos questionar e saber que vai também fácil o que vem sem esforço. Abramos nossos olhos para as situações já prontas e que não requer nenhum esforço, que são postas à nossa frente. Elas nos desviam da possibilidade de crescimento, de entrar por uma porta que é estreita, mas que nos ajuda a exercitar nossa humanidade diante das inúmeras adversidades apresentadas pela vida.

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